domingo, 15 de maio de 2011

O grilo



Fui aos grilos. Afinal, é como andar de bicicleta, não se desaprende com o tempo.


Apanhava-os ao pé do Ribeiro, perto do Ordonho, entre o cheiro da roupa a corar, a sinfonia grilante, o sol e a erva que servia de tempre à roupa estendida. Entre o regar da brancura de lençóis, camisas e outros farrapos, lá se ia escarafunchando uma e outra casota de grilos. A arma era uma haste de junco que por ali se nos oferecia à mão. Sentindo-se picado, o tesouro de antenas, nunca pensando que eram festinhas ou cócegas, saía da sua casa natural, para viver temporariamente numa caixita de fósforos.

Havia também daqueles caçadores que, por falta de jeito, de junco, ou paciência, mijavam para a toca, para que a presa saísse. Com sorte, salvava-se de um afogamento. Era a "grila" a chamar pelo grilo! Mas o terror não acabava aqui. O apanhador ainda se punha com uma cantilena igualzinha à que vinha dos buraquitos - gri... gri... gri... gri... salta cá pra fora que eu já te vi! E os mais curéis acrescentavam "c'oa faquinha e c'o facão pra cortar teu coração". Claro que estes incentivos só faziam com que o grilo, se pudesse, esburacasse até ao outro lado do mundo.


Tirei-o da toca, suavemente, com o tal junco. Gravei-o na memória e guiei-o a casa. De longe, lá o vi regressar à soleira da porta para continuar o seu canto.

Só faltou um bocadito de serradela para lhe agradecer a reportagem.




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