Ao ver as actuais notícias sobre o temporal no Rio de Janeiro, transcrevo uma passagem da correspondência de Joaquim Gonzaga Ribeiro a seu primo Edgar, ilustrativa de uma situação semelhante no mês de Abril de 1922, no Rio de Janeiro, quando se encontrava aí emigrado.
“A chuva tem sido de tal ordem que numa das ruas, a do Lavradio, a agua attingiu dois metros de altura, deixando depois de se escoar, uma altura de 1,50m de barro amarello que escorrega que nem sebo. Ainda no sabbado passado a chuva foi tanta, que em S. Christovão, onde a agua subiu tambem cerca de dois metros, houve meninos que se deitaram a nado e assim se divertiam em corridas de natação, em plena rua, com a ssistencia de muitos espectadores que de camarote janellas assistiam aos torneios natatorios. Alguns fulanos houve que carregaram para a rua com as banheiras de zinco e nellas navegavam á laia de barcos. Emfim um pagode em que tive forçadamente de tomar parte, pois que no passado sabbado para sahir de casa tive de montar um preto que me carregou durante uns 5 minutos até me pôr em terra firme, e digo firme, pois que só no seco é que a terra é firme visto que onde está molhado, com a lama, a gente ás duas por trez está de cocoras ou com as mãos no chão. (…) Ainda fallando de temporal te direi que ainda esta manhã pensei que a casa onde moro ia a baixo com os saccões que o vento por trez vezes lhe deu, o que me fez sahir de casa mais cedo, com receio de ficar esborrachado debaixo da casa como succedeu já estes dias a 6 pessoas e isto em virtude das casas aqui terem pouca resistencia, o que se torna desnecessario pois nunca aqui houve inverno como neste verão, pois que não sei se sabes que aqui agora é que é o verão ( II ) ao contrario dahi, que estaes agora no inverno. O que é certo é que ha dois dias segudos ( sic) que a chuva não para e se assim continua, a gente fica peixe. Peixões já cá havia, mas agora parece que tudo vae virar a peixe. (…) Mas como ia dizendo e contando, na tal photographia que espero tenha ficado boa apesar de estar na occasião o tempo bastante escuro e chovendo, estou eu em trajos de fazer a viagem atravez do .. rio... de Janeiro. Se dér coisa de jeito como espero te mandarei um exemplar para veres como a gente tem de andar no presente diluvio. Só o que falta é estar sem as botas, precaução esta que deve ser tomada por quem tenha amor ás botas que custam muito a ganhar. Quando chove de mais e a gente tem mesmo de se metter á agua, é muito vulgar a gente descalçar-se e de botas na mão caminhar atravez das ruas sem que se repare nessa toilette de necessidade e de occasião. O diabo são escorregões que se dá na lama. Emfim, Deus leve para longe tanta chuva, que vem estragar a vida e a roupa á gente.”
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