sexta-feira, 5 de março de 2010

Arqueologia dos ofícios e profissões I

O contínuo avanço da ciência e da tecnologia possibilita aspectos benéficos à sociedade, mas arrasta consigo um conjunto de ofícios e profissões que passam rapidamente para o domínio da arqueologia. Os grandes centros comerciais e hipermercados, o progresso económico (?), o desparecimento da agricultura tradicional de subsistência são alguns factores que contribuem para esse desaparecimento. Restarão algumas actividades artesanais que poderão alimentar-se de um turismo insuficientemente explorado.
Tendo como ponto de estudo Alpendorada, já raramente se houve falar e muito menos ver actuar o capador que preparava o porquito para a engorda durante o ano, culminando na matança pelo meses mais frios do Inverno. Nesta situação, actuava o matador ( ainda me lembro do senhor "Clidres" que anualmente vinha fazer essa tarefa, sendo, geralmente pago, com uma febras do porco, no dia da "desmancha").

Matança do Porco, em Várzea do Douro ( foto gentilmente disponibilizada por Arlindo Carneiro - R. Janeiro)

O vedor era essencial para a marcação do poço, uma vez que o abastecimento de água se fazia e ainda se faz através de um poço. Actualmente as perfuradoras conseguem abrir um furo e encontrar água a grande profundidade, substituindo, assim o trabalho do vedor e o do mineiro, tantas vezes perigoso e fatal.

Abertura de um poço. Momento em que "nasce" a água.

O transporte e arrumo da água fazia-se, em tempos, em vasilhame de folha de flandres e zinco, substituída depois pelo plástico. Isto fez com que o latoeiro/ funileiro também deixasse de ter procura. Se passarmos da água para o vinho, as constantes reduções na produção de vinho por pequenos proprietários e os novos materiais utilizados no armanezamento dos vinhos terminaram, há muitos anos, com a presença sazonal do tanoeiro no lugar do Memorial.
Maçarico utilizado pelo Sr. Rodrigo Pinto na arte de latoaria.


Memorial- Casa onde o tanoeiro sazonal organizava a sua oficina e estaleiro de pipos.

As padeiras que, de canatra à cabeça, percorriam a freguesia para distribuir o pão fresco -os "moletes" escondidos debaixo de um pano branco - também já desapareceram, assim como as sardinheiras. Ainda restam, felizmente, as vendedeiras de tremoços e castanhas, no lugar do Memorial, a lembrar um recepcionista da terra. Os moleiros também já são raros ou mesmo inexistentes. Para as bandas dos rios Tâmega e Douro, foram-se os barqueiros. E destas terras fundas onde cresce o vime, já não lembra o cesteiro.


Sr António, outrora barqueiro em Fontelas.

Sr Álvaro "Cesteiro" ( falecido há décadas)
(Foto digitalizada por F. Costa e gentilmente disponibilizada por M. V. Antunes)


O merceiro e o taberneiro vão desparecendo com os cafés e outros mercados. Até os alfaiates (recordo dois) foram tapados por tanto pronto-a-vestir. Nesta área dos têxtil, somente na Serrinha, ainda laborava um tear manual, por duas irmãs tecedeiras, a pensar desistir do ofício por incapacidade e a quem tive o prazer de fotografar.

Tecedeira da Serrinha.(2007)

A senhora Maria com uma passadeira confeccionada no tear da Serrinha. (2007)

O comprador e vendedor ambulante de ovos, galinhas e coelhos, com uma bicicleta carragada com uma giga e a franganada a cacarejar só me baila na memória, quando, um certo dia, espalhou a carga de ovos na estrada, e as mulheres da vizinhança vieram aproveitar as gemadas, ali para os lados do Ribeiro. Qual vírus qual quê! O que não mata engorda!


O senhor Torcato.
(Digitalização de Fernando Costa, segundo foto disponibilizada por M.V. Antunes)

E as cozinheiras que iam de casa em casa para fazer as bodas? Deve ser muito raro. Perde-se um costume em que o verde e a sopa seca integraram uma ementa ancestral.

As especialistas das ementas tradicionais servidas nas bodas "à moda Antiga".

Para o Caminho Velho, encaminhavam-se as loiças partidas como malgas, pratos e travessas para que se lhes desse um jeito, com uns agrafos e uma certa cola biológica. Os guarda-chuvas também não escapavam à mestra de consertos - a Mouca, como lhe chamavam.


A "Mouca" a consertar um prato.

(Digitalização de Fernando Costa, segundo foto disponibilizada por M. V. Antunes)

Nenhum comentário: